sexta-feira, 27 de novembro de 2009

cartas rancorosas

Tenho o costume de escrever cartas que não entrego. Confesso ser um péssimo hábito, até porque sempre me atrapalho na hora de dizer as palavras, e para escrever é necessário o mínimo de organização do pensamento, já que a carta tem a intenção de substituir a pessoa na hora, então não vai ter quem explique caso seja mal interpretada.
As cartas que não envio são carregadas de sentimentos, já que tento parecer indiferente nas situações que me levaram a escrevê-las. Então elas tratam ou de um amor exagerado ou de uma raiva profunda, mas como o Leminski disse, o amor não acaba, vira matéria prima para a raiva.

Elogio a Superficialidade
17/11/2009

Flusser diria em "A sociedade das imagens técnicas" que as imagens são inacessíveis em seu interior, consumimos apenas imagens superficiais. Não conhecemos a "caixa preta" onde essas imagens são geradas, seus mecanismos são estranhos e sua linguagem não é compreensível, mas temos a superfície. Assim você se mostra na minha vida, traçamos uma relação onde não tenho contato com o que te constitui, sei das tuas palavras, dos teus gestos, mas não sei nada do que as comanda.
Uma caixa preta inacessível e indecifrável, essa é a forma como vejo os teus sentimentos, não tenho acesso a eles, apenas ao teu corpo, a tua superfície.
Alguém me falou uma vez sobre a teoria dos corpos serem todos iguais, foi o Milan Kundera em nossas conversas insustentáveis. Bem, no mundo da razão todos os corpos são iguais e os sentimentos são reações hormonais, o amor é a memória e a paixão a explosão dos hormônios.
Agora veja o que nós temos. Uma relação na superfície de corpos semelhantes aos que cruzamos diariamente, uma memória cada vez mais distante e hormônios que não explodem mais.

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