quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Amor começa tarde

Amor e seu tempo

Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.

É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe

valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.

Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência herdada, ouvida.

Amor começa tarde.

Carlos Drummond de Andrade

domingo, 7 de dezembro de 2008

De ariana para dionísio

Porque tu sabes que é de poesia
Minha vida secreta. Tu sabes, Dionísio,
Que a teu lado te amando,
Antes de ser mulher sou inteira poeta.
E que o teu corpo existe porque o meu
Sempre existiu cantando. Meu corpo, Dionísio,
É que move o grande corpo teu

Hilda Hilst

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

amanhã de manhã

Menina amanhã de manhã
Quando a gente acordar quero te dizer
Que a felicidade vai desabar sobre os homens
Vai desabar sobre os homens
Vai desabar sobre os homens

Na hora ninguém escapa
Debaixo da cama, ninguém se esconde
A felicidade vai desabar sobre os homens
Vai desabar sobre os homens
Vai desabar sobre os homens

Menina, ela mete medo
Menina ela fecha a roda
Menina não tem saída
De cima, de banda ou de lado

Menina olhe pra frente
Menina, todo cuidado
Não queira dormir no ponto
Segure o jogo, atenção de manhã

Menina a felicidade
É cheia de praça, é cheia de traça
É cheia de lata, é cheia de graça

Menina a felicidade
É cheia de pano, é cheia de peno
É cheia de sino, é cheia de sono

Menina a felicidade
É cheia de ano, é cheia de eno
É cheia de hino, é cheia de ono

Menina a felicidade
É cheia de an, é cheia de en
É cheia de in, é cheia de on

Menina a felicidade
É cheia de a, é cheia de é
É cheia de i, é cheia de ó

É cheia de a, é cheia de é
É cheia de i, é cheia de ó

Menina amanhã de manhã| Tom Zé e Perna